TaediumVitae
Desempregado, time caiu pra terceira divisão, artrite cada vez pior,
senhorio no encalço, dor intermitente no peito, geladeira vazia, mulher com caroço
esquisito no seio esquerdo, filho drogado, xi, mais essa, válvula da descarga quebrou.
Suspicaz
Você anda muito desconfiante, querida, muito desconfiante, sinto isso
no fundo da alma, de mais a mais é preciso dizer que não existe homem em tais
condições inteiramente fiel, não existe, nem mesmo Diógenes com sua lâmpada
conseguiria encontrá-lo em plena luz do dia, de modo que você precisa acabar de vez com
isso, querida, do contrário, não lhe trarei outras flores no próximo finados.
De repente, quando menos se espera, aparece alguém que se destaca e causa espanto. É o
caso de Evandro Affonso Ferreira. Mineiro de Araxá, nascido em 1945,
autodidata, foi redator publicitário por 20 anos. Montou um sebo com os 3.000 livros que
tinha em casa e, no dia 26 de outubro de 2000, aos 55 anos, lançou seu primeiro livro,
"Grogotó!", Editora Topbooks - Rio de Janeiro - 2000, com 73 contos pequenos,
alguns com menos de 30 palavras, que trazem em si histórias inteiras, com fechos
trabalhadamente inesperados, surpreendentes. Depois, vieram "Araã!" (2002),
"Erefuê" (2004), "Zaratempô!" (2005) e "Catrâmbias!"
(2006). Seu estilo cativou o conhecido escritor Moacyr Scliar, que afirmou:
"Seus contos, muito curtos - raros são aqueles que ultrapassam meia página -
primam pelo refinamento, pela precisão da linguagem. É possível definir duas
influências, ou pelo menos duas afinidades em seu trabalho: com Dalton Trevisan e com
Guimarães Rosa. Do primeiro ele tem o humor cruel, escatológico até ("Pobrezinha,
não agüenta mais o futum dos meus puns."). E, como Rosa, ele vai buscar na
pitoresca, mas simbólica linguagem popular do Brasil os termos e as expressões que,
misturadas à frase de caráter mais erudito, dão um peculiar fascínio a seu
texto."